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segunda-feira, novembro 26, 2007

Crônica de várias mortes anunciadas OU a insanidade de lotar estádios de futebol

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No final da tarde de domingo, no programa "Bola na Rede", da RedeTV!, o locutor Luiz Alfredo saudava o Bahia pelo retorno à série B e enaltecia o clube por ter a melhor média de público das três divisões do Brasileirão (40,4 mil por jogo). Naquele exato momento, o time baiano empatava com o Vila Nova (GO) por zero a zero, na Fonte Nova, e confirmava o acesso. Mais de 60 mil, o público. Pouco depois, no precário estádio, um pedaço da arquibancada superior cedeu e a cratera no cimento tragou vários torcedores para uma queda de 20 metros (foto acima, de Welton Araújo - Reprodução). Até o momento, sete morreram.

Voltemos a 4 de março de 1971. Texto do jornal A Tarde de hoje: "A Fonte Nova (inaugurada em 28 de janeiro de 1951) seria reinaugurada. Ganhou mais uma rodada de arquibancadas, a parte superior. Ninguém imaginava que tudo acabaria em tragédia. O presidente Emílio Garrastazu Médici estava presente. O Bahia jogaria a primeira partida contra o Flamengo e o Vitória faria a segunda contra o Grêmio de Porto Alegre".

Segundo o jornal, mais de 112 mil pessoas estavam lá. Mas o público pagante divulgado, pra variar, foi menor: 94.972 pessoas (a capacidade oficial era de 96.640). Segue o jornal A Tarde: "O jogo inicial foi tudo bem. O tricolor ganhou por 1 a 0, a torcida se agitou e as arquibancadas balançaram, mas ninguém ligou. Por volta das 19 horas, no meio do segundo tempo, o Vitória empatava com o Grêmio em zero a zero, quando tudo começou. Um boato de que o estádio estava desabando gerou pânico, as pessoas começaram a pular da parte superior para baixo 'como se fosse uma cachoeira humana', conforme registros da imprensa na época". Resultado: dois mortos e 2.086 feridos. Coincidentemente, registra ainda A Tarde, foi do mesmo lado do acidente de ontem.

Ou seja: o mesmo estádio, a mesma arquibancada, o mesmo evento, a mesma lotação insana e, infelizmente, o mesmo resultado. Lembrando do discurso eloqüente e floreado de Luiz Alfredo, de que "quanto mais pessoas num estádio, melhor", fico me perguntando: pra quê? Quando vejo imagens de estádios lotados, não vejo festa nem espetáculo. Vejo perigo, insegurança, desconforto, histeria coletiva, riscos de toda sorte. Tudo bem que a Fonte Nova está um lixo, é um estádio podre. Mas, ao contrário do acidente de ontem, o de 36 anos atrás ocorreu por pisoteamentos, e não desabamento. O que me faz concluir que, juntou muita gente, dá merda (com o perdão da palavra).

Gostaria que a mídia repensasse esse oba-oba de "time que leva mais torcida". Em 2006, achei ridícula a disputa entre São Paulo e Atlético-MG para ver quem lotava mais o Morumbi ou o Mineirão. Este ano foi o Flamengo no Maracanã e o Bahia na Fonte Nova. Uma hora tinha que acontecer uma tragédia. Inevitável. Melhor seria que, nesses grandes estádios, a lotação máxima fosse de 25 ou 30 mil pessoas. Para quê mais? 20 mil pessoas com conforto, segurança, transporte, alimentação e tranqüilidade é muito melhor que 60 mil se espremendo e correndo risco de morte. Lucro ou "espetáculo" de torcidas valem mais que vidas?

Só para completar, reproduzo a lista de acidentes em estádios brasileiros publicada por A Tarde:

MORUMBI – Em 2 de março de 1969, no meio de uma partida em que o Corinthians ganhava do São Paulo por 4 a 2 um raio caiu próximo ao estádio. No meio do empurra-empurra, um muro desabou. Um torcedor morreu e 40 ficaram feridos.

MARACANÃ – Em 19 de julho de 1992, decisão do Campeonato Brasileiro, entre Flamengo e Botafogo, estádio lotado; 20 minutos antes do jogo começar, o alambrado da arquibancada superior cedeu e mais de 40 torcedores do Flamengo caíram em queda livre de mais de quatro metros sobre os que estavam na parte baixa. Três morreram e 90 ficaram feridos.

TAUBATÉ – Em 21 de setembro de 1995, o lateral Vítor, do Corinthians, foi jogar a camisa para a torcida depois de uma partida contra o Vitória, em Tabauté. Cerca de 300 pessoas se aglomeraram no muro da arquibancada. A estrutura desabou e 20 torcedores caíram no fosso. Cinco saíram gravemente feridos.

ALBERTO SILVA - Num jogo entre Tiradentes e Fluminense do Rio, em 1973, em Teresina, capital do Piauí, o alambrado desabou. Quatro torcedores morreram.

SÃO JANUÁRIO – Em 30 de dezembro de 2001, num jogo entre Vasco e São Caetano, o alambrado do estádio (Rio de Janeiro), que pertence ao Vasco, desabou: 140 pessoas ficaram feridas. As investigações da polícia culparam “os torcedores brigões” pelo acidente.

6 comentários:

Glauco disse...

Meu pai estava na partida entre Santos e Corinthians na Vila Belmiro que parte da arquibancada desabou, em 1964. Foram 181 feridos, nenhum grave.

Marcão disse...

A lista também esquece do Guarani x Corinthians em 94, quando a polícia misturou as duas torcidas no tobogã do Brinco de Ouro, em Campinas. Teve briga, corre-corre, tumulto e várias pessoas pisoteadas. Uma morreu (minha prima Cláudia estava no tobogã nesse dia, com o namorado, na única - e última - vez que pisou num estádio).

Anônimo disse...

marcão, se não me engano nesse jogo do guarani nao foi a polícia que liberou o acesso, foi a corintianada que invadiu

Marco Antonio disse...

Podemos contabilizar tb com a final da super copa de juniroes entre Palmeiras x São Paulo em 1994 (acho que foi este o ano)?

disse...

A final da Super Copa de Juniores foi em 1995... Frise-se que lá o Pacaembu estava em reformas, a presença maciça era de torcedores de organizadas e, só pra variar, tudo ocorreu por descaso e irresponsabilidade dos responsáveis. A Fonte Nova vai cair, isso já foi definido ontem. Mas, me pergunto: depois de quase 20 nos no poder, quantas mais vidas terão de ser perdidas em detrimento da ganância desse cidadão presidente da CBF e de outros mais?? Será que em 2014 veremos manchets do tipo: parte da arquibancada do Minerão cede e 30 torcedores que assistiam Eua x França morrem??

Está na hora de se cobrar soluções urgentemente!

Anônimo disse...

Meu avô estava no Maracanã em 1992 ele faleceu faltando 5 dias para o meu aniversario de 1 ano... todo dia lembro do acontecido e fico muito triste...
obrigada!